Música + Cinema; 'Some Kind of Monster', Metallica (2004)
Música + Cinema; 'Some Kind of Monster', Metallica, de Joe Berlinger (2004)
Em um determinado episódio da série de desenhos The Simpsons, os personagens participavam de um concurso chamado How Low You Can Go, algo como "Quão baixo você pode ir". Não era uma exibição do melhor de cada um, mas do seu pior, do mais grotesco que cada pessoa podia fazer. Com Some Kind of Monster, o Metallica dá uma credencial de backstage para o público, mas também revela ser uma banda heavy metal nos níveis psicológico e pessoal.
O período abordado pelo documentário - da saída de Jason Newsted até
os primeiros shows de lançamento de St. Anger - é o mais sombrio da
carreira do grupo, mais delicado inclusive que a morte de Cliff Burton
em 1986. Se lá era o auge do Alcoholica, observamos o nascimento do
PsicologA. Toda a tensão acumulada em anos de estrada, bebida e música
explode quando o processo de composição muda. Saem as letras de James
Hetfield e entram versos produzidos coletivamente. É o estopim que
quebra mais ainda a banda por dentro e o documentário capta a cena da
explosão maior: Jaymz sai do estúdio, bate a porta e vai parar em uma
clínica de reabilitação por longos meses.
Com um dos cérebros da banda desconectado do mundo, resta a Lars Ulrich e Kirk Hammett pensar não só o Metallica,
mas também as suas vidas. Se Kirk está tranqüilo - e muitas vezes diz
que as coisas vão acontecer, os problemas serão solucionados, numa visão
um pouco Poliana versão
metal -, Lars sofre as conseqüências da sua postura de rockstar... as
críticas por investir em arte, a dor de ver Jason Newsted tocar e pagar
para ter todo o staff de roadies do Metallica para o desconhecido Echobrain enquanto o Metallica
não tem rumo e, principalmente, todo o eco do caso Napster. Esse
episódio poderia ser melhor abordado, mas o documentário arrisca e até
mostra o clássico cartoon "Money Good, Napster Bad". É o retrato
perfeito de uma banda de metal rachada, tão rachada que até os fãs
começam a abandonar.
A figura do psiquiatra Phil Towle revela a
sua importância na volta de Hetfield. Peça-chave para a gravação do
disco, ao passo que serve para conduzir e evitar novos atritos entre a
banda, deixa-se levar pelo ritmo e chega a ser alvo de piadas sobre a
sua presença nas gravações. Como diz Nietzsche, quando você olha muito
pro abismo, o abismo olha pra você. Além disso, o eterno líder do
Alcoholica admite que a presença de Phil foi como ter um novo pai na sua
vida. E, mesmo que seja uma propaganda de bom moço, ver uma pessoa
trocar a caça de ursos na Rússia por mais tempo com a sua família já é
uma atitude louvável.
Em vários momentos, Lars e James criticam toda a fama, todo mainstream agregado ao Metallica
nos últimos anos. Também pudera, não é fácil ser líder no metal, líder
no rock em si, ter baladas tocando em rádios românticas e ainda tentar
seguir o seu fluxo natural de criação. O fardo da fama pesou nos ombros e
a própria saída de Jason revela isso no começo do documentário. Quando
alguém tenta respirar fora do grupo os outros naturalmente o criticam -
sendo que a postura despojada de Jason é o sonho dos que ficaram.
Bob
Rock, alvo de boa parte das críticas pós-black álbum, aparece como um
produtor/amigo de Lars, que sabe o que deve fazer para continuar com a
banda. Cada vez mais, aparece como um membro "não- oficial" da banda,
situação que não é do agrado de Hetfield. Fica no ar a pergunta "será
que a presença de Bob Rock faz bem pro Metallica?".
O barco vira quando a banda entra em sintonia, quando os egos - brilhante a cena sobre os solos de guitarra - entendem que só vai existir Metallica
se houver tolerância e, principalmente, capacidade de reconhecer e dar o
braço a torcer. James consegue uma proeza, que é aceitar que outros
escrevam letras - mesmo que elas fiquem uma bela coleção de fucks. A
letra de Sweet Amber não só mostra que a banda não gosta de algumas
coisas do estrelato, mas ainda mantém um pouco do sarcasmo de outrora.
Essa
virada de jogo chega ao auge na escolha do novo baixista. Se o clima
parece não fluir na sessão com os fãs, a motivação por encontrar alguém
para preencher o posto que Bob Rock esquentou dá fôlego para o trio. É
nítida a superioridade de Robert Trujillo na disputa com os outros. Os
candidatos todos tinham os seus méritos, mas o "ogro" do Suicidal
Tendencies encaixa fácil na trupe, pena que Battery não aparece na
íntegra. Ele ainda mantém a força no baixo, pois mesmo o saudoso Cliff Burton e Jason eram os mais elétricos no palco.
Outros
pontos interessantes da jornada são as referências aos atritos
presentes no passado, em um interessante resgate das gravações do Black
Album. A cena faz você ter vontade de rever A Year and a Half in a Life
of Metallica, outro bom vídeo da banda. Some Kind of Monster também prova que o Metallica,
seja fazendo marketing ou descargo de consciência, sabe fazer vídeos
(não falo de clipes). Live Sh*t, Cunning Stunts e S&M acompanham bem
esse fluxo.
Mas o melhor momento do filme é protagonizado por Dave Mustaine. Outrora alcoólatra, foi expulso da banda em 1982 e montou o Megadeth por vingança e recalque. O sentimento, que já fora mostrado no especial do Megadeth
para o canal norte-americano VH1 e lançado em DVD por aqui com o nome
do programa (Behind the Music), faz com que o bad boy revele ser um
cordeiro que até hoje reclama estar fora do rebanho, a eterna mágoa de
estar fora do clubinho. O desejo de voltar ao passado e receber um
convite para o Alcoólicos Anônimos e não a expulsão da banda, junto da
frase de novela "você não sabe o que eu passei nestes anos", coloca
Mustaine no seu devido posto de falastrão do metal.
Some Kind of Monster é um grande ajuste de contas do Metallica
com seus fãs. Talvez mais interessante para quem conhece o som, é um
belo documentário sobre como os rockstars ficam velhos e reagem às
pressões do meio. É preciso estar com a cabeça aberta para ver e também
pensar sobre todo o "mondo Metallico". Se o Spinal Tap (e o Massacration
também, de um jeito brasileiro) é a piada do metal - não compreendida
por todos -, o filme é o oposto, o mais denso drama do gênero musical.
Basta ver a cena de Lars gritando FUCK na cara de James para ver o clima
de chuvas e trovoadas entre eles. Mais de 1200 horas de gravação por
mais de um ano afastam esse vídeo de outras produções como The
Osbournes.
Chamado por alguns de Psicológica, a obra dá novos tons
ao turbulento St. Anger, mas ainda não o salva da nota 7 e da bateria à lá tambor de lixo. As quase duas horas de filme mostram que fazer este
CD foi uma prova de fogo para a banda. Quem olha e ainda acredita na
banda fica com uma esperança de dias melhores, que contagia até quem
pelo menos espera alguma música decente do quarteto. Sobreviver após
este inferno indica que o Metallica
tem mais força do que imagina, basta apenas voltar a pensar como seres
que erram e que precisam aceitar os outros para continuar em frente.
Olhe a banda rindo do comercial para a rádio e tire as suas conclusões.
Pessoalmente, acho que ainda há música pela frente.
O ponto
negativo fica na abordagem um pouco branda de Kirk e, principalmente
Lars. James ganha o status de bebum oficial do grupo, ofuscando boa
parte da fama dos outros amigos - que também já enfrentaram problemas
semelhantes. As drogas
fazem parte do universo rock and roll e talvez faltou à dupla Joe
Berlinger e Bruce Sinofsky mexer mais nesse ponto. Apesar disso, o saldo
é altamente positivo, pena que não passou nos cinemas por aqui.
O Trailer;
A Trilha sonora;
Um EP foi lançado como single da faixa, que pertence ao álbum 'Death Magnetic' com algumas faixas ao vivo para completar a trilha. Confira o tracklist;
1. Some Kind of Monster
2. The Four Horsemen (live)
3. Damage Inc. (live)
4. Leper Messiah (live)
5. Motorbreath (lve)
6. Ride the Lightning (live)
7. Hit the Lights (live)
8. Some Kind of Monster (edit)
2. The Four Horsemen (live)
3. Damage Inc. (live)
4. Leper Messiah (live)
5. Motorbreath (lve)
6. Ride the Lightning (live)
7. Hit the Lights (live)
8. Some Kind of Monster (edit)
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