Disco da Semana; 'The Unforgettable Fire', U2 (1984)
Disco da Semana; 'The Unforgettable Fire', U2 (1984)
Três discos. Quem, hoje em dia, tem o direito de lançar três discos para emplacar um hit? Nesse nossos tempos de internet. você só tem um soco, uma chance de capturar a atenção do ouvinte. Muitos artistas morreram nesse processo, os famosos "One-Hit Wonders".
E o U2 estava quase virando um. Na verdade, nem hit era de verdade; "New Year's Day" era conhecida, mas conseguiu posições tímidas nas paradas para uma banda que almejava mais e que lotava os lugares onde tocava. Essa era a sina deles até então; Banda ao vivo, que cativava pela energia das apresentações e nem tanto pelo número de músicas conhecidas do grande público.
E eles precisavam mudar isso, e rápido.
Mas como?
A ideia era chamar Brian Eno, mentor da guinada musical de David Bowie nos anos setenta e músico colaborador do Roxy Music, Robert Fripp e David Byrne, para produzir um disco diferente, que usasse o estúdio de forma intuitiva para que dali saísse um novo som, mais sofisticado e detalhista, mas sem perder a grandiosidade que era a marca da banda. Parece difícil não? E foi. Muito.
Junto de Eno veio Daniel Lanois, músico canadense que havia sido engenheiro de som de alguns trabalhos anteriores do primeiro e que estava engatinhando na produção. E a primeira ideia deles foi; Ambiência. Se enfurnaram no antigo Castelo Slane, em Dublin e usaram as grandes salas de pé alto para tirar a grandiosidade que a banda queria. Tentar criar intimidade na multidão.
Esse experimento cravou o que a banda seria dali pra frente; Desde "The Unforgettable Fire", todos os discos foram feitos assim. Ele foi a primeira demo tape de uma ideia difícil e trabalhosa.
E ainda faltava 'o' hit... E ele veio.
O disco abre com "A Sort Of Homecoming", Batida intricada, guitarra espacial e melodia desconstruida. Temas são desimportante. O que importava era o clima. A letra desconexa lembra poesia. Uma música que te ganha com o tempo.
Daí, o hit. "Pride (In The Name Of Love)", talvez, a música mais conhecida da história do U2. E ela foi trabalhada para isso. No documentário "The Unforgettable Fire Sessions" pode-se ver o tempo e o esforço que a banda e os produtores colocaram nessa canção. Talvez, ela seja a conexão perfeita da encarnação anterior deles com o que estaria por vir. Estádios, não mais arenas... É até hoje, a faixa mais executada ao vivo de sua carreira.
"Wire" é a antítese de Pride. Rápida, estranha. O baixo, cheio de floreios, tentava transformar a sonoridade em algo mais maduro. Eles estavam tentando se tornar músicos de verdade.
"Wire" é a antítese de Pride. Rápida, estranha. O baixo, cheio de floreios, tentava transformar a sonoridade em algo mais maduro. Eles estavam tentando se tornar músicos de verdade.
E conseguiram na faixa-título. "The Unforgettable Fire" é a jóia do disco. Cadenciada e climática. Européia até o osso. Incrivelmente conectada aos sons que a banda produziu nos anos noventa. Letra poética que flutua nos pianos e nas guitarras de Edge.
"Promenade" é outra jóia. Um improviso de estúdio que capturou a atenção de Brian Eno. Letra narrada. Linda. Uma canção de amor pós-sexo. Chegar á altura máxima que o amor pode te elevar.
"4th of July" é um interlúdio desnecessário. The Edge começa a encontrar o seu lado experimental nesse disco. Logo após, em 86, ele lançaria a trilha do filme "Captive" que é praticamente uma continuação desse conceito, que foi novamente revisitado no projeto "Passengers" em 95.
A segunda parte do disco, teoricamente feito para ser mais experimental, começa com "Bad". Definitivamente, o maior hino da banda. Música que cresceu muito ao vivo e que vendeu a nova imagem que eles queriam de sí mesmos. Ela, sozinha, foi a responsável pelo impulso que faltava para que atingissem a estratosfera. Especialmente, sua performance em Wembley, pelo Live Aid de 1985. Bono á acha mal escrita. Realmente, seu tema sobre heroína narrado na perspectiva de uma pessoa tentando ajudar alguém sobre uma base climática repetida a exaustão, só foi fazer sentido quando, no palco, a banda enxertou subidas e descidas na melodia...
"Indian Summer Sky" viaja sobre sua poesia dispersa entre batida e baixo. "Elvis Presley and America", a seguinte, nada mais é que a batida de "A Sort Of Homecoming" desacelerada e Bono improvisando letras e melodia sobre ela. Uma canção de ninar para Elvis entupido de drogas. Uma demo. Bono até hoje diz que gostaria de ter a refeito.
Pra fechar, "MLK". Uma canção delicada, poética e definitiva sobre Martin Luther King. Muito mais que "Pride". Como se a urgência da mudança proposta pelo álbum fosse embora, e no seu lugar, vemos Bono, sozinho, se despedindo da Terra.
Duas faixas que sairam como lado B do single de "The Unforgettable Fire" deveriam estar nesse álbum. "Love Comes Tumbling" e "The Three Sunrises". A primeira é, fácil, uma das melhores faixas escritas no primeiro período da banda. Melancólica e cadenciada, não lembra nada feito por eles antes. Já a segunda é um rock celta que gruda na cabeça. Ficaram de fora em privilégio á experimentação provavelmente.
A sorte da banda foi que "Pride" pegou. A Rolling Stone americana os colocou na capa sob o título de "Band Of The 80's". O Live Aid selou a imagem militante da banda e, ao vivo, nas duas turnês que se seguiram (a "Unforgettable Fire Tour" e a "Conspiracy Of Hope") prepararam o terreno para o que viria a seguir, em 1987...
Mas nesse disquinho esquisito, de capa com cara de quadro, sem melodias fáceis, cheio de experimentos cabeça, morava a banda que conhecemos hoje. Um passo pra trás e duzentos para a frente.
E o tempo provou que estavam certos.
Tracklist;
01. 'A Sort of Homecoming'
02. 'Pride (In The Name of Love)'
03. 'Wire'
04. 'The Unforgettable Fire'
05. 'Promenade'
06. '4th of July'
07. 'Bad'
08. 'Indian Summer Sky'
09. 'Elvis Presley and America'
10. 'MLK'
01. 'A Sort of Homecoming'
02. 'Pride (In The Name of Love)'
03. 'Wire'
04. 'The Unforgettable Fire'
05. 'Promenade'
06. '4th of July'
07. 'Bad'
08. 'Indian Summer Sky'
09. 'Elvis Presley and America'
10. 'MLK'
Ótimo texto! Creio que a sentença "Banda ao vivo, que cativava pela energia das apresentações e nem tanto pelo número de músicas conhecidas do grande público." talvez resuma o sentimento do público em geral em relação às novas músicas da banda. Tomara que o próximo álbum mude isso.
ResponderExcluirUma observação: Pride (In The Name Of Love) é a segunda música mais tocada da banda. A primeira é I Will Follow.
Esse disco realmente é fodao demais!!!
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