Discoteca Básica; 'Killer', Alice Cooper (1971)


Discoteca Básica; 'Killer', Alice Cooper (1971)

Março de 73: durante uma vernissage nas galerias Knoedler, em Nova York, Salvador Dali desvela para o mundo seu holograma do Alice Cooper. A obra em 3D também inclui um cérebro humano, um dos famosos "relógios flácidos" de Dali e uma bomba de chocolate - para o artista, símbolos do som do grupo. No meio da festa alguém pergunta a Alice se Dali tinha ouvido seus discos. "Não tenho a mínima ideia", retrucou o cantor. "Mas o que adoro em Dali é que ele não faz sentido. Ele me disse que queria fazer nosso holograma porque éramos as pessoas mais confusas que já tinha visto. Esta é a única coisa que temos em comum: confusão."



E que confusão para lá de surreal Alice Cooper instalou na cena musical americana, no começo dos anos 70. Mais que o V.U., os Stooges, Kiss ou os New York Dolls, fora eles - Alice Cooper (aliás, Vincent Furnier, vocal), Michael Bruce (guitarra), Glen Buxton(guitarra), Dennis Dunnaway(baixo), Neal Smith (bateria) - quem melhor souberam tirar proveito do etnos decadente que envolvia primitivismo sonoro, violência estetizada e ambigüidade sexual . Seus integrantes privilegiavam o choque: nos shows, o grupo - antecipando em décadas a podreira dos RevCo e Gwar - promovia esquartejamentos, vestia camisa-de-força, matava animais, esmagava bonecos a machadadas. Mas o que atiçava mesmo os fãs era o clímax., com o enforcamento do próprio Alice; um ato grand-guinolesco bolado depois que a banda leu uma reportagem sobre o corredor da morte e ficou sabendo que as pessoas lá presentes frequentemente tinham orgasmos invonluntários ao final das execuções.

O potencial de AC acabou sendo farejado pelo empresário Shep Gordon, que assinou a banda ao então recém-criado selo Straight, de Frank Zappa. É verdade que os primeiros discos - "Pretties for You" (69) e "Easy Action" (70) - não eram lá grande coisa, mas uma correção de percurso levou os caras de L.A. para Detroit. E aí aconteceu: após um trabalho legal com o produtor Bob Ezrin em "Love it to Death" (71), Alice Cooper pôs a América de quatro com "Killer".

Inicialmente incensado pelo finado Lester Bangs, o registro terminou relegado a um segundo plano pela crítica ortodoxa. Mas qualquer sujeito cujos tímpanos vibrem pelo rock & roll em estado bruto não tem como negar: pouquíssimas vezes um grupo logrou arrancar dos instrumentos uma música tão furiosa e desatinadamente visceral quanto a que se ouve em "Killer". Com um drive hipomaníaco, "Under my Wheels" abria o disco imprensando os remanescentes da love generation contra os pneus de um cadillac cor- de -rosa. "You Drive me Nervous", "Yeah, Yeah, Yeah" e "Be my Lover"traziam riffs de guitrras lapidares - talvez os melhores que Keith Richards jamais tocou. Já a cinematográfica "Desesperado" mesclava trilhas de western com a saga de um serial killer que cantava seus crimes se afogando em sangue.

Ainda mais bizarras são "Halo of Flies" e "Dead Babies". Enquanto esta última pode ser vista hoje tanto como uma ode à necrofilia quanto a precursora das canções anti abuso infantil da história, "Halo..." ( que batizou um grotesco power-trio da gravadora independente Amphetamine Reptile) sugere um passeio de olhos vendados por uma montanha-russa, tal a alternância vertiginosa de suas múltiplas passagens melódicas - que vão de um subderivado trash da abertura de "Tommy" até a folia circense. O tiro de misericórdia é dado pela faixa-título e sua funérea coda, marcando os passos de um condenado rumo ao cadafalso. Um disco "matador", com toda certeza!


Arthur G.Couto Duarte (Revista Bizz, edição 102,Janeiro de 1994) 



Tracklist;
1. Under my Wheels
2. Be My Lover 
3. Hall of Flies
4. Desperado5. You Drive me Nervous

6. Yeah, Yeah, Yeah
7. Dead Babies
8. Killer





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